Campanha #4

Os quatro eleitores

Quando discutimos sobre o ciclo eleitoral não é menos verdade que o momento da votação surge como o cimo de todo o processo. Não é ainda menos verdade se afirmarmos que ao longo de muitos anos, os estudos sobre eleições concentraram-se em demasia na modalidade das eleições como a principal e única forma de participação política.
 
Contudo, nos últimos tempos o voto não só deixou de ser a maior forma de expressão política, como as mesmas eleições tendem a amunhecar enquanto primeira e única forma de contacto com os políticos, mesmo que em ‘democracia(s)’ continuem a ser as eleições o fórum primário para contacto entre dominantes e dominados numa relação de poder.
 
Nisto surgem três categorias quando falamos de eleitores e sua relação com partidos políticos ou política em geral:
 
Os primeiros são os chamados militantes, aqueles que entregam-se pela causa do partido, contribuem com os seus bens e assumem postura pública de devotos ao partido em causa. O voto destes é praticamente inalterável, são os primeiros da linha pelo partido. Não sabem se concordam ou discordam, mas votam.
 
Por conseguinte temos os membros, aqueles que apenas pela posse de um cartão ou de um documento de identificação partidária se aliam ao partido, sem com isso serem totalmente fiéis. O seu voto pode variar, mas usam-se do cartão para manter algum capital social ou mesmo político, por isso poderão votar para continuar a ostentar o cartão.
 
Em terceiro lugar encontramos os simpatizantes, esses não possuem cartão do partido, não são ferrenhos assumidos publicamente, mas possuem alguma réstia de consideração ao que o partido faz, sobretudo pelo suporte de vária ordem que dão ao partido. O seu voto é incerto, mas em última hipótese votam no partido pelo qual simpatizam ou são obrigados a simpatizar pelos retornos que isso pode trazer.
 
Porém, pensamos ser oportuno juntar um quarto eleitor, o qual preferimos chamar de ‘vote away’: este não sabe em quem votar, pouco se interessa pela política usual, desconhece qualquer que seja o manifesto político, nega ser mobilizado, a sua vida pouco depende do que vá suceder em termos resultados, mas talvez possa ir votar, mesmo sem saber as razões de tal.
 
Pensamos que os quatro eleitores por nós acima apresentados devem se tidos em conta quando lemos a paisagem política nacional, cada um do seu jeito. Existem valências que são próprias para cada tipo, e se assumirmos que apenas pelo cartão ou pela militância pública se poderá decidir o próximo xadrez político nacional seria analiticamente exagerado da nossa parte.
 
Os inúmeros exemplos de ‘banhos de multidão’ que vimos ao longo da campanha eleitoral escondem consigo uma particularidade que os próprios políticos já devem ter noção, do mesmo jeito que possuir um cartão de eleitor não é sinónimo de participação eleitoral garantida naquilo que já fora explicado num texto intitulado ‘’Recensear-se? Sim, mas e votar…?’’, por Domingos do Rosário e Elísio Meundane (Politique africaine, 2016).
 
Assim, caberá amanhã aos que pelo voto optar fazer o seu posicionamento enquanto um dos quatro eleitores, mas podem ainda criar uma quinta categoria, caso prefiram. Porém, se decidirem em não votar estarão igualmente a exercer uma forma de participação política.