Prefiro começar o texto com uma passagem elucidativa do capítulo 9 intitulado “O Jovem como lata de Lixo da Indústria do Consumo” do livro de Zygmunt Bauman – “Sobre Educação e Juventude”.
Segundo Bauman, um estudo recente, orientado pela Kaiser Family Foundation, descobriu que “jovens dos oito aos dezoito anos gastam agora mais de sete horas e meia por dia com smartphones, computadores, televisores e outros instrumentos electrónicos, em comparação com as menos de seis horas e meia de cinco anos atrás, e, quando se acrescenta o tempo adicional que os jovens passam postando textos, falando em seus celulares ou realizando múltiplas tarefas, tais como ver TV enquanto actualizam o Facebook, o número sobe para um total de onze horas de conteúdo de mídia por dia”.
A geração Smart Kicka é a geração de adolescentes e jovens perdidos no mundo virtual e cegos ao mundo físico que os rodeia. É importante que se diga, a geração Smart Kicka no nosso contexto pouco sabe da sua própria história, das suas origens e até mesmo da sua existência. Uma geração que vende a sua alma ao virtual, onde a única cultura e educação adquirida reduz-se ao uso de internet, redes sociais e novas tecnologias dos mídias que incluem em grande parte os telefones celulares. Esta é a geração que cai na boca dos mais velhos pelos maus motivos.
Uma geração que não questiona os acontecimentos que cobrem o mundo seja na Europa, EUA ou ainda na África e em particular, no seu próprio país. Esta é a geração sem cultura alguma e que não percebe o conceito de nação, ou da formação turbulenta do Estado moçambicano originária de uma guerra de libertação de 10 anos imbuída de interesses egoístas e individuais que surgiram posteriormente, ou então, de uma guerra de 16 anos que culminou em um acordo de Paz prematuro e desequilibrado.
A geração Smart Kicka é uma geração de consumo exacerbado motivado por este regime capitalista e de liberalismo económico individualista propalado pelas potências ocidentais que controlam o nosso futuro político, económico e social.
Geração que perde finais de semana consecutivos em “farras” e que acredita no sucesso imediato e fácil, enquanto uns e outros evoluem na descoberta de novas tecnologias lendo livros e adquirindo conhecimentos valiosos e decifrando os possíveis destinos da humanidade.
Uma geração de adolescentes e jovens inoperante face ao meio que os rodeia, apologista do ridículo, sem diferencial, originalidade ou autenticidade, que faz mímica a tudo que passa na TV e segue o sopro do vento e o movimento das multidões.
Uma geração que não sabe como funcionam as leis do universo e desconhece a verdadeira origem da luz que ilumina a lua e a terra, que se ri dos cabelos e do bigode do Einstein e do estado de Stephen Hawking.
Geração que usa o Facebook e Whatsapp mas não sabe ler ou escrever correctamente. Uma geração que não percebe que as maravilhas dos smartphones que usa vem da mente de Homens dedicados a horas de investigação e leitura de montes de livros científicos e didácticos. Uma geração que aos olhos do governo não inspira confiança alguma e que nela se perdeu a esperança na construção de um futuro melhor.
Esta geração não valoriza a oportunidade que tem de aprender a ler, que outrora, os nossos tios, pais e avós não tiveram, pois os acontecimentos políticos e sociais não permitiram, e estes, dariam tudo para ter a chance de sentir o prazer de ler um livro.
Estamos perante uma geração que vive da cultura cibernética, onde o seu parque de diversões é o ciberespaço, que rejeita a educação, o aprender, o inovar em troca de imitações ou cópias não autenticadas de outrem.
Arriscaria a dizer que a geração de jovens como eu, não tem sonhos, aspirações e esperanças em uma vida futura, não só para si, mas também para os seus próximos, e que está presa em um mundo em que o que mais importa é o presente, o agora, e tudo pode ser feito sem pensar nas consequências do dia seguinte. A minha geração de jovens embarca em aventuras onde reina a competição entre eles e até com os que viveram um pouco mais neste mundo.
Urge abrir a mente, o consciente e o subconsciente da nova geração de jovens não com lições de moral vazias transmitidas pelos responsáveis pela educação deste país, mas com princípios de respeito mútuo que só as instituições – família e sociedade – podem transmitir.
Não é de pretensão de ninguém ter jovens vistos e considerados um jugo para a sociedade, uma população dispensável aos olhos dos governantes e dos mais velhos, cuja presença seja motivo de preocupação e alarme.
Não é nosso desejo que a nossa geração seja tomada por fracassada e que viva da liberdade dos anos de independência como se esta não significasse absolutamente nada. Pretendemos uma geração de jovens comprometida e engajada nos princípios da harmonia, solidariedade e o mais importante, respeito pelo próximo.
Pretende-se uma geração ligada aos acontecimentos políticos, económicos e sociais do país e do mundo, que os entenda e reflicta com profundidade; Que a nossa geração não seja composta por analfabetos políticos, que acha que viver e pensar a política é um desperdício.
Queremos uma geração que pense no futuro dos seus filhos e netos, com a ideia de que proporcionar-lhes a melhor educação possível é garantir um futuro melhor, e, que discuta veemente e fervorosamente os problemas do país com a consciência de que a sua sobrevivência depende da melhor resolução dos mesmos.
Que jamais sejamos apenas um elemento para impulsionar a economia capitalista e de consumo, mantendo vivo o crescimento económico que nunca se transforma em desenvolvimento para o benefício próprio. Não sejamos uma geração comercializada, do consumo sem produção.
Que marquemos o nosso território neste país como se de jovens leões se tratasse e demonstremos que somos um grupo a ter em conta sempre. De tudo e de todas as coisas de melhor que queiramos ser, que percebamos sobretudo, que o nosso país é muito jovem, com uma história recente e cheia de obstáculos e que precisa de sangue jovem para mantê-lo vivo e saudável.
Que retiremos todos os estereótipos que nos são atribuídos, estereótipos de uma geração de jovens inerte e cega, consumista e auto-marginalizada; geração que recebe uma educação que transmite a cultura de consumo em massa; uma geração que concebe o uso da internet, das redes sociais, do Facebook, Whatsapp, Instagram, Twitter, das novas tecnologias de informação e comunicação, da televisão e dos tablets como sendo o único estilo de vida.
Em suma, que jamais sejamos vistos como a geração dos smartphones, ou simplesmente, a geração Smart Kicka.
Autor: Raul Barata