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Sobre o Estado de Emergência: (nós) também temos

Passou ontem, 7, uma semana após decretar-se o Estado de Emergência em Moçambique. Mas antes mesmo dos sete dias, não precisamos de muita imaginação para perceber que a implementação do vigente Estado de Emergência começou de forma mais atabalhoada e desajeitada possível, sobretudo quando recordamos as acções protagonizadas pela polícia Municipal em algumas capitais.

Não temos reservas em reconhecer que o país está a lutar como pode com as armas que possui, mas igualmente não precisaremos de nenhuma imaginação apurada para inferir que criamos uma realidade sob a qual não preparamo-nos prudente e previamente, e os exemplos para tal demonstração não são difíceis de encontrar, sendo que podemos aludir apenas três.

  1. A decretação deste tipo de situações merece algum preparo que antecede ao próprio acto em si. Tomemos como caso gritante o sector dos transportes, onde não se consegue perceber que plano emergencial (pré)existia para dar resposta ao que momento que esperamos viver. As enchentes por conta da míngua de transporte, a apreensão de motorizadas e a prisão de detentores de bicicletas é disso um exemplo flagrante. Até aqui não se consegue perceber o que realmente andamos a fazer entre o espaço que separou a preparação do Decreto de Estado de Emergência e o seu anúncio. Fica-se com a impressão que ‘’corremos atrás da galinha já com o sal na mão’’. Aliás, pensamos ser problemático exigir que se cumpra uma medida sem ser-se capaz de colmatar a ausência do serviço em causa. Não é nenhuma novidade a incapacidade que se instalou ao longo dos sucessivos Governos em prover um sistema de transporte que seja sério e funcional. Quem fala do transporte pode igualmente falar do violento desespero que se vive no seio dos vendedores informais e dos milhares de moçambicanos que tem no dia-a-dia o seu pão nosso.
  1. Embora se reconheça o devido gabarito comunicacional do Ministro Armindo Tiago, fica ambíguo perceber como funciona a task force team que lida com a pandemia da COVID-19. Os corredores de informação são pouco perceptíveis e a sua fluidez deixa muita a desejar, basta acompanhar o que é dito e escrito (e depois divulgado) em cada briefing diário – um conjunto de retalhos. Os comandos de comunicação da actual crise podiam merecer outra dinâmica, sobretudo na imagem que pretendemos transmitir do ponto de vista de comando e acção. Aliás, sobre isto talvez não fosse necessário buscar longe, basta alguma atenção em saber inspirar-se com esperteza e inteligência sobre o que é feito noutros países. A comunicação é fundamental, quem a faz e como faz tem um papel estrutural e estruturante no sucesso ou fracasso em períodos de crise.
  1. Neste último ponto focamo-nos nos cuidados tidos pelo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano, um dos primeiros actores que entrou em cena após o Ministério da Saúde. Admitindo todas as limitações organizacionais sobejamente conhecidas, parece-nos que neste sector existiu atenção para responder aos desafios ora colocados, sobretudo na tentativa de manter o fluxo de ensino, apesar da distância. É para nós evidente a capacidade de adaptação daquela entidade, mesmo que se admitam falhas ou desafios como acesso nalgumas plataformas (desigualdades de oportunidades) e despreparo dos próprios professores no uso de tais espaços.

In fine, fica-nos a conclusão e hipótese que apenas decretamos o Estado de Emergência para no fim dizer ‘’nós também temos’’, dado que vários são os países que igualmente fizeram-no. Não nos parece que se tenha declarado tal Estado de situação em resposta ao coronavírus. Não cabe em nós que após a decretação desse mesmo Estado o país se mantenha igual em termos de acções que visem suprir os efeitos nefastos que tal emergência vai ter para além da própria doença. Aliás, a parcimónia na reacção de algumas entidades em exigir a implementação do Estado de Emergência é um claro e límpido indício de reconhecimento da incapacidade que se tem em fazer cumprir uma norma sob a qual não se criou condições mínimas para sua aplicação. Em outras palavras, diríamos que continuamos no ‘’Estado de Estado’’ e não Estado de Emergência propriamente dito.